segunda-feira, 6 de julho de 2009

A DEMOCRACIA DA MINORIA


Por Marcelo Fernandes Fonseca

A organização social e política do Brasil, que fora e continua sendo ideologicamente construída, possui vestígios de uma sociedade que, segundo Marilena Chauí, “é marcada pela estrutura hierárquica do espaço social (...) fortemente verticalizado”. Ou seja, as relações entre os grupos sociais são e estão estabelecidas da seguinte forma: “um superior que manda e um inferior que obedece”.[1]
Raymundo Faoro, salienta que o poder efetivo de comando prevalece a mercê de uma pequena parcela da sociedade. Diz: “o estamento, quadro administrativo e estado-maior de domínio, configura o governo de uma minoria (...), o efetivo comando da sociedade, não se determina pela maioria, mas pela minoria, que a pretexto de representar o povo, o controla, deturpa e sufoca”.[2]
Vivemos em pleno o século XXI, o ranço de uma herança senhorial, marcada pelo conservadorismo paternalista da minoria. E o povo? Percebemos historicamente, a mínima participação das camadas populares nos eventos econômicos, sociais e políticos do Brasil. Juntamente com a escravidão, são fatores, que de certa forma, nortearão a formação do Estado Nacional Brasileiro. Vejamos alguns exemplos na História.
Revoltas ocorridas no Brasil nos séculos XVII e XVIII, nativistas ou separatistas, como Beckman, Mascates, Felipe dos Santos, foram lideradas pela elite colonial. Emilia Viotti da Costa nos mostra que “entre os Inconfidentes, a maioria era composta de proprietários e altos funcionários”. Na Conjuração Baiana, a participação popular foi um pouco mais numerosa, porem, o grupo dominante era “constituído por elementos instruídos e de recursos, e figuras importantes da sociedade”.[3]
Com a chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil no inicio do século XIX, a autoridade política dos grandes proprietários aumenta. Por estarem geograficamente afastados do núcleo político nacional, a cidade do Rio de Janeiro, controlavam e direcionavam o poder local. Segundo Maria Isaura de Queiroz, “os senhores de engenho do Nordeste e os fazendeiros do Vale do Paraíba, estabelecidos a mais tempo na política, detinham o poder”.[4] A aristocracia brasileira comandava as Câmaras Municipais, controlavam a vida de seus subordinados e faziam leis em beneficio próprio.
As vésperas da Independência, diante das contradições e do choque de interesses dos controladores do poder, prevaleceram segundo Caio Prado Junior, as intenções do Partido Brasileiro. Para o autor, o Partido Brasileiro “representava as classes superiores da colônia, grandes proprietários e seus aliados”.[5] E o povo?
Durante a Proclamação da República o povo assistia a tudo “bestializado” [6]; na chamada República Velha, fraudes e interesses econômicos mantinham a elite no poder. Quando reformas de base estavam previstas, militares, com discurso de defender a honra da pátria contra o comunismo, mas aliados a burguesia nacional, assumem o poder. Adeus reformas... Adeus democracia.... E o povo?
Percebemos, a partir desta pequena amostra, que nos principais momentos da História do Brasil, a participação popular fora diminuta. A camada mais baixa da população esteve e está suprimida em nome dos interesses de uma minoria. Interesses disfarçados de democracia, mas para quem? Revoltas populares ocorreram, porem eram localizadas e facilmente controladas.
A dominação social prevalece. A política local, principalmente no interior ainda é controlada por oligarquias que dominam determinadas regiões do Brasil. O trânsito de tais oligarquias na capital federal é livre; manda e desmandam. Sarneys, Magalhães.....Vivemos orquestrados sob a batuta da democracia de poucos. Poucos podem, poucos fazem, e fazem pouco. Eles regem nossa vida, e se dizem democráticos; fazem leis em benéfico próprio e desrespeitam o primeiro artigo de nossa Constituição: “Todo poder emana do povo”.

[1] CHAUÍ, Marilena. Brasil: mito fundador e sociedade autoritária – São Paulo: Perseu Abramo; 2007.
[2] FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro – São Paulo: Globo, 1997. vol 1.
[3] COSTA, Emilia Viotti. Da Monarquia a República: momentos decisivos – São Paulo: Brasiliense, 1994
[4] QUEIROZ, Maria Isaura. O mandonismo local na vida política brasileira e outros ensaios – São Paulo: Alfa - Omega, 1976
[5] PRADO JUNIOR, Caio. Evolução política do Brasil e outros estudos – São Paulo: Brasilense, 1994
[6] CARVALHO, Jose Murilo. Os bestializados – São Paulo: Companhia das Letras, 1987

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